“Ser missionários e formar missionários!”


Entrevista com Pe. Luiz Faustino dos Santos – sacerdote da Arquidiocese de Mariana em trabalho missionário na Arquidiocese de Manaus

No desenvolvimento da sensibilidade missionária no Seminário São José, o Conselho Missionário do Seminário (COMISE) unido à formação convidou o missionário Pe. Luiz Faustino para presidir a Eucaristia na Comunidade formativa da teologia no dia 13 de março. Após a celebração, houve um momento de partilha de seus trabalhos na Amazônia.

Aproveitando a oportunidade entrevistamos Pe. Luiz Faustino.

COMISE: Você vem exercendo seu ministério sacerdotal na região amazônica. Conte um pouco sobre esta experiência missionária.
Pe. Luiz Faustino: Posso dizer que tenho três anos e meio de trabalho na região amazônica. Prestei serviço à Arquidiocese de Porto Velho-RO de 2004 a 2006 e agora estou há um ano em Manaus-AM. Tenho por princípio não escolher onde trabalhar. Quando peço ao bispo para colaborar numa diocese mais carente, deixo a critério do mesmo escolher para onde vou. A única condição que apresento é que seja uma diocese carente, sobretudo de vocação sacerdotal.

Porto Velho marcou muito em minha vida, apesar do pouco tempo que lá fiquei: 30 meses. Fui encarregado pelo Arcebispo, Dom Moacy Grechi, de reorganizar o Conselho Missionário Diocesano (COMIDI) e preparar as Santas Missões Populares na Arquidiocese. Visitei todas as paróquias da Arquidiocese (24), numa área de 82.000 km2, em números redondos (aproximadamente, 4 vezes maior do que a Arquidiocese de Mariana que tem 22.000 km2, em números redondos). Trabalhamos com uns 3.500 missionários/as leigos/as.

Ultimamente estou aqui em Manaus, junto com o Pe. Leonardo, na Área Missionária São Francisco. São 16 comunidades com uma população de 80.000 habitantes. A criação de Áreas Missionárias foi uma das experiências que deram certo na Arquidiocese de Manaus. Consiste num conjunto de comunidades com vida própria, porém constituindo uma unidade através do Conselho de Pastoral da Área Missionária (CPAM) e dos trabalhos que realizam juntas: retiros, encontros de formação, Escola de Teologia Popular, etc. Foi uma antecipação do Documento de Aparecida, quanto à descentralização, a rede de comunidades e o empenho evangelizador.

COMISE: Quais são os maiores desafios da Igreja hoje para a nova evangelização?
Pe. Luiz Faustino: Em 1975, Paulo VI em Evangelização no Mundo Contemporâneo, já insistia numa nova evangelização. O documento tem 36 anos e os desafios aumentaram. Os maiores desafios da Igreja Católica são as divergências internas, geradas pelo individualismo da sociedade pós-moderna, que atingiu a Igreja.

Creio que o pluralismo interno da Igreja mais atrapalha do que ajuda na evangelização. A mídia, em geral, é inimiga da Igreja. Até as redes católicas de televisão deixam muito a desejar quando se trata de unidade pastoral. A Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) aponta numa direção e algumas programações televisivas apontam para outra e, em nome do pluralismo religioso, quebram a unidade tão sonhada pelo fundador desta Igreja, Jesus Cristo (cf. Jo 17,21). Outros grandes problemas são: o eclesiocentrismo em vez do cristocentrismo; a sacramentalização em vez da evangelização; a massificação das pessoas em vez da consciência comunitária.
Comemorando os 50 anos do Concílio Vaticano II, é hora da Igreja acordar (cf Rm 13,11) e olhar para além de seu próprio umbigo: o povo é mais importante que o templo, e o Reino é maior que a Instituição.

COMISE: Que significado tem a Missão para você?
Pe. Luiz Faustino: O significado da Missão para mim, é o mesmo entendido e propagado pela Igreja no seu magistério. “A Igreja é toda Missionária”. “A Missão é a razão de ser da Igreja”. “A única missão da Igreja é evangelizar” (Paulo VI). “A Missão é a essência da Igreja”. “A Igreja/comunidade nasceu da missão para ser missionária.” “A Missão organiza a comunidade e a comunidade faz a missão.”

Os documentos da Igreja, em geral, falam bonito sobre a missão. Missão no Mundo Contemporâneo de Paulo VI e Missão do Redentor de João Paulo II são dois documentos que deveriam ser profundamente estudado e praticado por todos os agentes de Pastoral, começando pelos agentes ordenados. Também os documentos latino-americanos, as Diretrizes Gerais da CNBB encantam a gente. Pena que não conseguimos tornar realidade os grandes projetos evangelizadores da Igreja!

A Igreja tem ótimas ferramentas, mas parece que só trabalhamos com amadores pouco entusiasmados. São tantos os agentes de pastoral despreparados, inclusive agentes ordenados e os/as consagrados/as! A Igreja só será verdadeiramente missionária, quando fizer discípulos de Jesus, não apenas membros da Igreja.

COMISE: Como você vê a formação missionária, nos seminários, dos futuros presbíteros?
Pe. Luiz Faustino: No contexto atual a gente vive uma preocupação e uma esperança. Preocupação com a tendência de uma volta ao passado no que é acidental. A superficialidade, tão comum na sociedade pós-moderna, atinge também os seminaristas. Quando a gente vê tanto tempo perdido, tanto papel gasto para defender a volta às antigas vestes eclesiais ou litúrgicas, ao rubricismo litúrgico, à imagem do padre/status, a sede de fama (padre mediático), a busca obsecada de pós-graduação sem um projeto eclesial... a gente fica preocupado.

Por outro lado, damos graças a Deus porque em muitos seminários já existe o Conselho Missionário dos Seminaristas (COMISE): isto é maravilhoso! Também porque – especialmente em Mariana – os  seminaristas estão saindo em missão nos períodos de férias e fazendo trabalhos pastorais nos finais de semana. Outro sinal de esperança é o fato de os formadores se encontrarem, periodicamente, para troca de experiência, revisão de métodos, etc.

Os desafios não nos abatem, porque a esperança não decepciona (cf. Rm 5,5).

COMISE: Deixe uma mensagem sobre o impulso missionário aos seminaristas.
Pe. Luiz Faustino: No mundo atual, ser cristão é uma grande aventura. Uma característica do jovem é o gosto pelo risco, é a busca do novo. Ser missionário, qualquer que seja a idade, é fazer a vida renascer a cada dia. Ser missionário é descobrir um grande prazer em pequenas coisas; é saber sorrir com as crianças, inquietar-se com os jovens, sonhar com os adultos e esperar com os idosos.
Nunca diga que não é missionário. Existe a missão para quem parte para longe: são os seguidores de S. Francisco Xavier; e a missão de quem fica: são os seguidores de Santa Teresinha. É vergonhoso um padre dizer que não é missionário. A Paróquia é o lugar onde ele deve exercer sua missão, organizando e animando comunidades missionárias.


Mesmo que a missão não seja uma aventura, não deixa de oferecer ao missionário-trampolins, taxados de obstáculos, que o faz caminhar para além do alcance das pernas e enxergar mais longe que o alcance das vistas. Vale a pena empenhar-se nesta busca, pois disse Jesus: “Eu estarei com vocês até o fim dos tempos” (Mt 8,20).

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