Livro do Deuteronômio
Pe. Anderson Luis de Souza, svd*
Introdução
Ao refletir sobre o livro um dos livros do Pentateuco, chamado
Deuteronômio, é importante iniciar com as palavras presentes do Constituição
Dogmática Dei Verbum, que
aponta no segundo parágrafo: “Aprouve a Deus, na sua bondade e
sabedoria, revelar-se a Si mesmo e dar a conhecer o mistério da sua vontade
(cfr. Ef. 1,9), segundo o qual os homens, por meio de Cristo, Verbo encarnado,
têm acesso ao Pai no Espírito Santo e se tornam participantes da natureza
divina (cfr. Ef. 2,18; 2 Ped. 1,4). Em virtude desta revelação, Deus invisível
(cfr. Col. 1,15; 1 Tim. 1,17), na riqueza do seu amor fala aos homens como
amigos (cfr. Ex. 33, 11; Jo. 15,1415) e convive com eles (cfr. Bar. 3,38), para
os convidar e admitir à comunhão com Ele. Esta «economia» da revelação
realiza-se por meio de ações e palavras intimamente relacionadas entre si, de
tal maneira que as obras, realizadas por Deus na história da salvação,
manifestam e confirmam a doutrina e as realidades significadas pelas palavras;
e as palavras, por sua vez, declaram as obras e esclarecem o mistério nelas
contido. Porém, a verdade profunda tanto a respeito de Deus como a respeito da
salvação dos homens, manifesta-se-nos, por esta revelação, em Cristo, que é,
simultaneamente, o mediador e a plenitude de toda a revelação.” (DV2)[1]
Desse modo, cada palavra presente nos
textos da Sagrada Escritura, traz elementos de um povo, sua cultura e suas
tradições e, em tudo isso, a ação revelada de Deus, trazida à humanidade por
meio de Jesus Cristo, o anunciador do Evangelho do Pai.
Livro do
Deuteronômio
É o
quinto dos últimos livros do Pentateuco, título do hebreu Debarim quer dizer
“Palavras.” Assim, o título Deuteronômio vem da expressão inicial הדברים אלה
`elleh haddebarim ("estas são as palavras"): " Estas são as
palavras que Moisés falou a Israel "(Dt. 1,1).[2] Do mesmo modo, se deve entender que o título
é derivado de Deuteronômio 17:18, que traduzido da Septuaginta diz: “mandará
fazer num rolo, para o seu uso pessoal, uma cópia da lei.”[3]
Porém,
para entender este texto bíblico do Deuteronômio, é necessário entender que tal
livro registra os detalhes da segunda aliança sob Moisés, que foi feita nas
planícies de Moab quarenta anos após a aliança ratificada no Sinai (Dt. 29,1).
Mas
quem escreveu o livro do Deuteronômio? Por tradição alguns creêm que todo o
Pentatêuco foi escrito por Moisés, e que o livro do Deuteronômio foi todo
escrito a “próprio punho” (cf. Dt. 31:9, 22,24). Se afirmarmos que Moisés foi o
autor de Deuteronômio, se poderia datar que o livro foi escrito já no fim de
sua vida em 1.400 a.C ou 1.200 a.C. Porém, críticos dos tempos modernos
preferem distanciar-se da tradição da autoria Mosaica do último livro do Pentateuco,
e apoiam a ideia de que o livro do Deuteronômio tem a participação de
diferentes autores/editores, que compilaram os textos presentes no livro, que
está carregado de diferenrtes tradições, com pessoas vindas de lugares
diferentes, e que viveram em tempos diferentes. Alguns estudiosos sugerem que
os textos presentes no livro do Deuteronômio foi todo escrito e editado por
autores pós-exílicos.
É
importante salientar que o livro do Deuteronômio apresenta os três grandes
discursos de Moisés, e cada discurso contém a narração, a lei, e a exortação.
Além disso, no livro se apresenta uma expansão do primeiro mandamento do
decálogo (Ex. 20,5-6; Dt. 5,9-10). A atenção do autor deutoronomista é
apresentar a Israel pela boca de Moisés estes fatos: como o povo de Israel terá
sucesso em suas vidas, ao estarem estabilizados na terra a eles prometida, como
também a escolha de amar a Deus (YHWH/ יְהוָה) e ser fiel aos mandamentos, ou
de servir a “outros deuses.” Qualquer escolha feita terá as suas consequências,
que no livro é apresentado como “benção” ou “maldição” (Dt 11,26).[4] Assim:
“Uma
preocupação definidora do livro é a centralização da adoração. Sendo Deus
(YHWH) o único em todo Israel (6,4-5), sua adoração deve ser focada em um
lugar, que o Senhor "escolherá entre as suas tribos"; ali o Senhor
“fará habitar o seu nome”. Assim, o status privilegiado do Templo de Jerusalém
é afirmado; todos os outros lugares e todos os outros modos de adoração ao Deus
de Israel (os santuários locais, os “lugares altos”, “debaixo de toda árvore
verde”) são proibidos.”[5]
“Abre tua mão para o teu
irmão” (Dt 15,11)
Já são 50 anos que a Igreja no Brasil dedica o mês de
setembro para o estudo e a reflexão orante da Palavra de Deus. Esse gesto foi
iniciado pela Arquidiocese de Belo Horizonte, que celebrava em 1971 os 50 anos
de criação daquela Igreja Diocesana, de modo que foi ampliado anos depois,
sendo um convite que a Igreja faz à todas as pessoas para “beberem da fonte” que é
a Palavra de Deus.
O tema do Mês da Bíblia desse ano, “Abre tua mão
para o teu irmão” (Dt 15,11), proposto pela CNBB, é muito propício para
a o estudo, a oração e a reflexão. Tais palavras chamam a atenção do leitor
para a seguinte proposta, isto é, de não esquecermos dos pobres e daqueles que
vivem nas periferias sociais e humanas das nossas cidades. Essas mesmas
palavras foram acentuadas ao povo de Israel, para que eles se lembrassem de
atuar com justiça junto ao pobre, à viúva, ao órfão e ao estrangeiro, sendo
gestos concretos presentes no código da aliança (Ex. 20-23). Esta chamada de
atenção ao povo de Israel é também direcionada a todos aqueles que se dizem
conhecedores da Palavra de Deus, mas que se esquecem de pontos básicos da vivência
atuante da fé. Portanto, ao repetir as palavras da oração judaica, que é
cantada solenemente na liturgia, “Sh'ma Yisrael Adonai Eloheinu Adonai Eḥad” [“Escuta
Israel, o Senhor é nosso Deus, um é o Senhor”] cada pessoa é chamada a refletir de maneira sincera a Palavra de
Deus e a colocá-la em prática.
Conclusão
Ao fazer esta reflexão, não tenho a pretensão de ser
um especialista nos textos bíblicos, pois não o sou, ou mesmo, agir como se
fosse melhor do que os mestres da Sagrada Escritura que lecionam no Seminário
Arquidiocesano de São José, longe de mim agir ou pensar dessa maneira. Sou
somente alguém que deseja ser transformado pela Palavra de Deus, assim como
escreve o escritor inglês Richard Rohr: "A revelação bíblica nos convida a
uma experiência genuína"[6],
experiência esta que convida a quem lê os textos sagrados a repetidamente
“beberem da fonte” presente na Sagrada Escritura e a serem transformados por
cada palavra. Que este versículo do livro do Deuteronômio 15,11, “Abre tua mão para
o teu irmão”, nos leve sempre a uma verdadeira conversão de coração.
* Presbítero, religioso-missionário professo da Sociedade do Verbo Divino (Missionários do Verbo Divino/ Verbitas), nascido em Belo Horizonte, MG, porém grande parte de sua formação educacional, familiar e religiosa foi na cidade de Ponte Nova, MG, sendo membro atuante da Paróquia Santíssima Trindade em Ponte Nova, na catequese, liturgia, ministério de música, Legião de Maria e na SSVP (Comissão de Jovens). Ingressou no Seminário do Aspirantado da Sociedade do Verbo Divino (1998) em Juiz de Fora, MG. Formação acadêmica: Bacharel em Filosofia pelo ISTA/PUC-MG (2001), bacharel em Teologia (ITESP -2008), English Second Language (Divine Word College, Epworth, IA & International Language Instirute-ILI Washingston-DC 2005), Formação no Ministério Hispânico no Mexican American College, San Antonio, TX (Julho 2012). Dos onze (11) anos como ministro ordenado, 10 anos do ministério sacerdotal foram realizados por Padre Anderson parte do sul dos Estados Unidos, onde os membros da Sociedade do Verbo Divino (SVD), se fazem presentes, isto é, nas comunidades católica afro-americanas, comunidades de imigrantes hispânicos, presença na pastoral universitária, neste caso nos estados da Louisiana, Texas e Florida. Atualmente, Padre Anderson atua pastoralmente como pároco, na Paróquia São Pulo Apóstolo, com grande presença de imigrantes hispânicos, na cidade de River Oaks, periferia da região metropolitana de Dalas / Fort Worth.
[1] VATICANO
II. Constituição Dogmárica Dei Verbum
[2] HAHN,
Scott. Catholic Bible Dictionary. p.214
[3] Idem.
p.214
[5] Cf.
idem
[6] Cf. ROHR, Richard. Things hidden. Scripture as Spirituality. p. 8. A frase referente é de tradução nossa do inglês: “The biblical revelation invites us into a genuely experience."
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