A MISSÃO DA IGREJA É SER IGREJA DE MISSÃO.
A MISSÃO DA IGREJA É SER IGREJA DE MISSÃO
Carlos Henrique de Mattos Chaves
Indubitavelmente, “a Palavra de Cristo nos anima a sermos luz para todas as nações! Eis-nos aqui, nos envia, ó Senhor, sustenta em nós o ardor pela missão”, a partir deste pequeno trecho tirado do hino para o 4º Congresso Missionário Nacional de Seminaristas, nós congressistas fomos iluminados e impulsionados a viver tão grande e edificador encontro entre os dias 11 a 17 de julho de 2022, na cidade João Pessoa (PB). Conforme a proposta de reflexão do congresso “Missão ad gentes na formação de seminaristas”, fomos fomentados a trilhar e a viver, verdadeiramente, o caminho missionário, a exemplo de Jesus que assumiu, com muito amor, a Sua missão nesta terra, dando-nos uma ordem “ide por todo o mundo, proclamai o Evangelho a toda criatura” (Mc 16, 15). Neste sentido, ter participado deste evento foi, para mim, um momento singular de enriquecimento cultural, vocacional e sobretudo espiritual. Pude constatar que a Igreja é essencialmente missionária; ela não possui uma missão, mas a missão a possui. Portanto, dizer Igreja é dizer missão.
Preliminarmente, percebemos que o próprio Jesus nos anima na missão, quando Ele mesmo diz “como o Pai me enviou, também eu vos envio” (Jo 20, 21), a partir daqui entendemos que a “Igreja é por sua natureza missionária” (AG 2). Sabemos que o ponto principal de reflexão de Jesus aos discípulos é a sua missão no mundo: “e constitui Doze, para que ficassem com ele, para enviá-los a pregar” (Mc 3, 14). Nesta perspectiva, fica muito claro para nós que é nossa missão levar esperança, ou seja, levar Jesus aonde o mundo mais precisa. É o próprio Cristo que nos chama e envia a fim de anunciarmos “ a boa nova aos pobres, a curar os quebrantados de coração” (Is 61, 1). Sendo assim, todo cristão também é chamado a ser testemunha de Cristo, evangelizando o mundo, haja vista que a identidade da Igreja é evangelizar. Ora, a missão da Igreja é uma continuação da missão de Jesus Cristo.
Por este viés, é necessário que todos nós construamos a nossa vida em chave de missão. Para o cristão, é necessário anunciar Jesus Cristo. Muitas vezes percebemos que é até fácil anunciá-Lo, entretanto, somos convidados não somente anunciar, é preciso termos um encontro verdadeiro com Ele: “uma característica essencial da espiritualidade missionária é a comunhão íntima com Cristo” (RMi, §88). Ora, se não passar por uma disposição interior, o anúncio se torna apenas uma repetição de palavras que foram ouvidas e que podem ser, facilmente, propagadas. Contudo, antes, é de suma importância ter consciência de que a disposição missionária verdadeira é aquela que se reconhece pequeno dentro de um processo de conversão interior, testemunho autêntico e anúncio querigmático, por isso que a missão, intrínseca ao homem, também possui o caráter antropológico que passa do encontro pessoal com Jesus Cristo ao impulso do ser humano de anunciar a Boa Nova de Cristo aos confins da terra.
Torna-se fundamental para a missão esse encontro com Jesus Cristo, para anunciá-lo não tem outro caminho senão conhecê-Lo. É nesse encontro de amor que se realiza o contínuo caminho de conversão e é também nele que a missão se torna fecunda e dom para toda a humanidade, indo aos confins do mundo, se reconhecendo ad gentes. Sabemos que o exemplo da vida cristã e o anúncio de Jesus são os dois pulmões da Igreja, por isso é importante para nós enquanto seminaristas, padres e leigos anunciarmos com ousadia temperada de humildade, numa chave de sinodalidade, esse encontro que nos transforma e nos sustenta na missão, na relação intersubjetiva. É mister, portanto, ser dócil à ação do Espírito Santo, compreendendo que o missionário é impulsionado pela providência.
Evidentemente que missão é questão de fé. Sim, é uma adesão, ou seja, eu vivo ou eu não vivo a missão, sou fiel ou não, não existe uma terceira via para vivê-la. Infelizmente, hoje, conforme podemos diagnosticar a partir daquilo que presenciamos em nossa sociedade, a crise de fé é enraizada pela falta de missionariedade. É preciso termos consciência de que missão é deixar-se configurar a Jesus Cristo para testemunhá-Lo, haja vista que os discípulos de Jesus eram enviados em missão não para somente fazer missão, mas para vivê-la; não só para dar testemunho mas para viver, de fato, esse testemunho. Neste sentido, o que foi feito no início do Cristianismo para levar adiante sua missão universal continua válido e urgente hoje. Com efeito, “a Igreja é missionária por sua própria natureza, pois o mandato de Cristo não é algo contingente ou externo, mas atinge o próprio coração da Igreja” (RMi, §62).
Outrossim, conforme nos salienta também o Decreto Ad Gentes, a Igreja peregrina é por sua natureza missionária, porque tem sua origem na missão do Filho e do Espírito Santo, segundo o desígnio do Pai, ou seja, a missão trinitária ilumina a missão universal do povo de Deus. Além disso, missão é participação da Missio Dei, sendo assim, a Igreja não faz missão, mas é missão. Por isso, anunciar é um dever do cristão, é sinal de caridade. A missão, conforme vai nos apresentar a Evangelli Gaudium ,n. 273, não é uma parte da vida do ser humano ou um ornamento que pode ser posto de lado; é algo que não podemos arrancar do nosso ser, é para isso que estamos neste mundo.
Torna-se imperativo, aqui, recuperar a compreensão de missão como identidade e natureza da Igreja. Todavia, erroneamente, a concepção de missão pode estar, muitas vezes, reduzida a missão programática: fazer coisas, elaborar esquemas. Não! Precisamos superar esta compreensão histórica de missão entendida como atividade ou dimensão da vida pastoral, é fundamental recuperarmos a compreensão de missão como identidade, essência. Com efeito, é nítido que essa mudança de concepção e até mesmo de estruturas não é fruto de um estudo de organização do organograma funcional eclesiástico, mas é consequência da dinâmica da própria missão. O que derruba as estruturas “caducas” é justamente a missão.
Para tanto, parafraseando o Papa Francisco, o discípulo missionário não pode ser uma pessoa isolada em uma espiritualidade intimista, “caduca”, mas é uma pessoa em comunidade para se dar aos outros. Portanto, a missão implica pertença eclesial. Em síntese, nós somos cooperadores desta única missão de Deus, isto é, “a Igreja é missão porque Deus é missão” (AG 2). Desta pertença nasce a missão sem fronteiras, que é um impulso gratuito de dentro para fora, isso é perceptível quando Jesus vincula seus discípulos a sua missão e os envia. Sendo assim, a Igreja não possui uma missão, mas a missão possui uma Igreja, ora aquela precede a Igreja e lhe é constitutiva. Dizer Igreja, é dizer missão. Oxalá possamos ter a coragem de responder a Jesus Cristo “Eis-me aqui, envia-me” (Is 6, 8), que a partir do encontro verdadeiro com Ele possamos ter a sensibilidade para escutar “segui-me e eu farei de vós pescadores de homens” (Mt 4, 19).
À guisa de conclusão, a missão nasce desse encontro com Jesus que dá um novo horizonte à vida. Com efeito, pela missão, Deus é plenamente glorificado (AG 7), ser discípulo missionário está além de cumprir tarefas ou fazer coisas, mas está, única e exclusivamente, na ordem do ser, ou seja, é existencial, por isso não se reduz a algumas horas do dia, “não é que a vida tenha uma missão, mas a vida é uma missão” (GE 27). Portanto, é necessário anunciarmos Jesus Cristo “a sua glória por entre as nações, pelos povos todos as suas maravilhas” (Sl 96, 3), Ele é o centro que convoca e envia, provocando em nós, através do Espírito Santo, um movimento de saída que nos desinstala e exige de nós uma permanente conversão missionária pessoal, pastoral e estrutural.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
A BÍBLIA de Jerusalém. Nov.ed.rev. São Paulo: Paulinas, 1985.
DECRETO AD GENTES. Concílio Vaticano II. In: COSTA, Lourenço (Org. geral e trad.). Documentos do Concílio Ecumênico Vaticano II. São Paulo: Paulus, 1997.
FRANCISCO. Exortação Apostólica Evangelii Gaudium: a alegria do Evangelho – Sobre o anúncio do Evangelho no mundo atual. São Paulo: Paulus/Loyola, 2013.
______. Exortação Apostólica Gaudete et Exsultate: sobre a chamada à santidade no mundo atual. São Paulo: Paulus, 2018.
JOÃO PAULO II. Carta Encíclica Redemptoris missio (Sobre a validade permanente do mandato missionário). São Paulo: Loyola, 1991.
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