A vida é missão


 “Ide sem medo para servir” – estas palavras proferidas pelo Papa Francisco na ocasião do encerramento da JMJ 2013, no Brasil, chegam ao coração de todos aqueles que se deixaram ser encontrados por Cristo. Somente quem encontrou o Senhor é capaz de servir sem medo, de amar, de levar esperança. Ir e servir (anunciar): este é um mandato do Senhor (Mt 16, 15). Não se trata de um pedido ou um simples conselho: é, antes, um mandamento, o qual não é opcional para a Igreja; é uma obrigação, como nos recordou o Concílio Vaticano II: a “Igreja é por sua natureza missionária” (AG 2). Como Igreja viva, é missão de cada batizado levar esperança, ou seja, Jesus aonde o mundo mais precisa. Só abraça essa missão quem se encontrou com o Mestre, pois o anúncio é fruto de uma experiência de encontro. Anunciar é, para além dos discursos, viver identificado com Jesus; e a vida do batizado ganha sentido à medida que compreende isso e integra a missão em seu caminho na doação aos irmãos.

Nossa missão de batizados é levar esperança quando encontramos, nos caminhos da vida, tantos sofredores numa cultura de morte, na qual há tantas notícias de violência e suicídio e tantas outras chagas que a humanidade já enfrentava e que essa pandemia escancarou. Como ser sinal de Deus, revelar ao mundo que a vida tem jeito e vale a pena? Como mostrar a alguém que a vida tem sentido e que Jesus é a fonte de onde jorra abundantemente sentido e esperança? O caminho é amar sem medo, na certeza de que amando estou evangelizando e vivendo o mandamento maior, o amor. Como afirmara Santa Teresinha do menino Jesus: “Só o amor explica a missão”; e nós podemos dizer ainda que o amor é missão! Amando Jesus no outro é possível ser reflexo do amor de Deus tocando a carne sofredora dos irmãos, descobrindo, como santa Terezinha, que nossa vocação é o amor e afirmando, como São João Paulo II, que o “amor explicou tudo”.

Ser missionário é deixar-se ser conduzido pelo Espírito Santo; Ele é o protagonista de toda a missão eclesial, “Ele quem conduz a Igreja pelos caminhos da missão”, como afirma o Catecismo da Igreja (n. 852). O Espírito sopra onde quer e como quer e suscita dons e carismas; é Ele quem nutre e sustenta a fé dos discípulos missionários de Jesus. Ele suscita diversas maneiras de cooperar na missão evangelizadora da Igreja: pela entrega aos irmãos, pela doação de si, pela partilha dos bens e dos dons, pela renúncia do supérfluo e da tentação de ser senhor de si e pelo desejo de ser instrumento de Deus na vida dos irmãos. A missão acontece quando vemos pessoas e grupos que se entregam nesse caminho e se deixam consumir pela causa do evangelho. A missão é dinâmica e está na raiz e identidade da Igreja, acontecendo ininterruptamente onde se testemunha o amor divino por palavras e ações.

 “A missão é feita: com os pés dos que partem; com os joelhos dos que rezam e com as mãos dos que ajudam”. Este pensamento de Leão XIII ajuda a compreender o horizonte vasto e profundo da missão. Esta não pode ser reduzida a ir de porta em porta ou a lugares distantes falar de Jesus, mas é algo encarnado na Igreja e parte integrante do povo de Deus que não é possível arrancar de seu ser. O Papa Francisco, na Gaudete Et Exultate (n. 27), afirma: “Não é que a vida tenha uma missão, mas a vida é missão”. Somos convidados a integrar a missão na vida internalizando tudo que nos acontece como oportunidade para santificação e sinal do cuidado de Deus. O Evangelho de João traz o relato da samaritana que, além de anunciar com as palavras, deixou para trás a vida que levava, simbolizada no vaso que ficou para trás e seguiu a Cristo, como único Senhor (cf. Jo 4, 28). A missão não pode perder de vista o encontro com o mestre, porque Jesus é missão e n’Ele, com Ele e para Ele o cristão escuta o chamado, responde o seu sim e anuncia, a partir do lugar existencial em que se encontra.  

Assim como a samaritana, os apóstolos e os primeiros cristãos, todos nós somos chamados a testemunhar para o mundo “o que vimos e ouvimos” (At 4,20). Ser missionário é testemunhar! Não é possível esconder, silenciar e não testemunhar o que Cristo faz em nós, porque tudo o que Cristo toca é transformado e renovado, e uma vida renovada exala santidade, exala autenticidade, exala união com o Divino, exala algo que o mundo não tem e não pode dar. O apóstolo Paulo disse “ai de mim se eu não anunciar o evangelho” (1Cor 9,16), porque depois do encontro não dá mais para fugir, não dá para se enganar ou fingir que não ouviu o chamado, não dá para viver distante do Amado como se ele não existisse e não esperasse uma resposta. Pobre e infeliz aquele que não compreendeu que mais do que fazer isso ou aquilo na Igreja o Senhor nos chama a todos a estar com Ele, a sermos todos Dele.

Ser missionário é ter compaixão. Não é possível desvencilhar a missão da vida, porque a vida é missão e é no dia-a-dia da nossa existência que somos chamados a sentir com os irmãos, estar junto, sobretudo, dos pobres e marginalizados. Quando a dor do outro não me afeta, não muda nada em mim e não me impele a amar e a ser solidário, é preciso conversão. Num mundo de tantas cruzes e dores é inconciliável uma fé alienante, vazia de empatia, proximidade, serviço; porque se falta compaixão falta o que Cristo nos ensinou: amar e ser solidário com os que sofrem. As alegrias e as esperanças, as tristezas e as angústias dos homens de hoje, sobretudo dos pobres e de todos aqueles que sofrem, são também as alegrias e as esperanças, as tristezas e as angústias dos discípulos de Cristo” (GS 1). Não é possível ser discípulo de Cristo se alguma realidade não falar ao nosso coração clamando por justiça e paz para o nosso povo.

Ser missionário é escolher Cristo todo dia, é colocar-se diariamente num processo de conversão, é olhar para si mesmo e compreender que não se está pronto, mas num caminho de construção e aprendizado para ser cristão no mundo. Vivemos numa realidade em que escolher a Cristo é ir radicalmente na contramão do mundo; este, que é ceifador de vidas e oportunista, onde tudo é transitório; onde coisas passageiras ocupam lugar do que é eterno; onde vemos pessoas que se dizem cristãs seguindo caminhos que não estão de acordo com o proposto pelo evangelho. Escolher Cristo é se rebelar contra a cultura de morte que escraviza e mata! Que amparados pela Virgem Maria, mãe missionária, e impulsionados pelo Espírito Santo, escolhamos a Cristo sem medo de servir, sem medo de recomeçar quantas vezes forem necessárias, sem medo de errar e de testemunhar “tudo o que vimos e ouvimos” (At 4,20); porque sendo a vida missão, onde há vida há razão ser missionário.

João Pedro Silva Ribeiro

2º ano de Teologia

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

A MISSÃO SE FAZ COM AMOR, POIS DO AMOR VEM A MISSÃO

Ite ad Joseph

Maria: Mãe, modelo e formadora dos missionários